Diziam as más-línguas que o filme a Rede Social de David Fincher iria-nos retratar Mark Zuckerberg, o fundador do facebook, como alguém ambicioso que não olharia a meios para atingir os seus fins, traindo os melhores amigos, roubando ideias a outros, incapaz de estabelecer relações afectivas.
O filme de Fincher é um retrato fidedigno do funcionamento da sociedade americana extensível ao mundo em que vivemos. O enfoque de Mark é o sucesso, o reconhecimento e a validação pessoal. Tal como referia o psicanalista António Coimbra Martins numa recente entrevista ao Expresso, “o que nos move agora é o êxito e o medo de falhar. Nas sociedades de sucesso a vergonha substituiu a culpa”.
Mark não sente culpa quando toma as decisões que o tornaram no bilionário mais jovem da história recente. Ele está demasiado estimulado com a construção e desenvolvimento dum sistema que está curiosamente a mudar a nossa vida social. Ele está empenhado em suceder perante os seus pares e alcançar o poder corporativo. Ele está empenhado em suceder perante a rapariga que o rejeitou por ser demasiado estranho, arrogante e desajeitado.
No entanto, numa das cenas do processo que o opõem ao seu ex-sócio, a arrogância do seu discurso, intelectualmente brilhante, é interrompida pelo olhar do amigo traído, num momento de confrontação afectiva. Tal como com a rapariga que o rejeita, Mark não consegue gerir o mundo dos seus afectos. Provavelmente não consegue identifica-los de forma a agir congruentemente com estes. Só lhe resta mesmo os canais virtuais do facebook.
Mas será Mark Zuckemberg um sacana sem sentimentos? Parece-me que Mark é mais o jovem adulto desamparado cujo sentir não foi suficientemente validado. Mark está sozinho num mundo cruel sem saber como se aproximar dos outros para além de os vencer. No final do filme somos confrontados com os sentimentos que restam a Mark, está sozinho e deseja proximidade com os outros.
O facebook é em larga medida uma ferramenta construída para resolver esta necessidade de proximidade e conexão. Nas projecções virtuais o eu multiplica-se em argumentos para convencer os outros, o privado passa a ser público, a identidade virtual confunde-se com o real.
No mundo real a esfera privada está protegida pelas decisões que tomamos quando nos revelamos aos outros. A gestão da nossa privacidade protege os nossos sentimentos e reforça a diferença entre quem sou, o que os outros são, e como nos vêem. A proximidade resulta do desejo de conhecer o que não se conhece e que é diferente de nós. A proximidade resulta também do desejo que os outros reconheçam que somos diferentes e que valemos a pena conhecer e possivelmente amar.
O facebook espelha este desejo mas está limitado por um eu fragmentado que não corresponde ao que eu sou no real. Um eu com mais história e decisões e tal como Mark com desejo de afecto real.
À imagem de Mark, os membros do facebook ficam expostos pela imagem que criaram e pela forma como gerem facilmente as relações virtuais, mas não tanto pelos seus sentimentos e identidade reais. No facebook eu posso apagar num segundo um amigo e ganhar outro, posso até entrar em contacto com o passado que já estava arrumado e ser seduzido pela fantasia que construo a partir da imagem do outro.
O facebook pode ser de facto uma janela para o exterior, para partilhar ideias, criar petições e abrir caminho para o sucesso mas não substitui a inevitável confrontação com a verdadeira realidade do outro e de nós próprios. Estou apenas escondido a espreitar pelo buraco da fechadura para um mundo tão fascinante como imaginário.
De facto foi por causa do facebook que quase destrui a minha vida!
Conheci uma pessoa muito mais nova que eu, as minhas carências afectivas que estavam ao rubro e, supostamente, encontraram nessa pessoa o seu fim.
Nada mais errado. Os aspectos em comum eram muitos, assim como as diferenças, mas a dependência afectiva e o medo de ficar só extenderam a paixão e a espectativa. Após uma muito breve interrupção, retomámos a relação que terminou meio ano depois.
Neste momento uso o facebook, mas conheço todas as pessoas que estão no meu grupo de amigos. Recuso-me a aceitar pessoas desconhecidas.
A minha história vale o que vale, mas acho que serve de chamada de atenção para outras pessoas que sejam ingénuas e carentes!